Muitas vezes são invocadas revisões curriculares de outros países para apoiarou criticar revisões curriculares no nosso País. O Grupo de Trabalho de Matemática debruçou-se sobre esta questão.
O Grupo de Trabalho de Matemática foi constituído em 2018 pelo Despacho n.º 12530/2018, de 28 de dezembro para "proceder à análise do fenómeno do insucesso, tendo em vista a elaboração de um conjunto de recomendações sobre a disciplina de Matemática - ensino, aprendizagem e avaliação."
Aqui é reproduzido o apanhado sobre currúculos internacionais recentes contido no início do capítulo 6 (p. 118-120) do documento Recomendações para a melhoria das aprendizagens dos alunos em Matemática (1.ª versão - 30 de junho de 2019), elaborado pelo Grupo de Trabalho de Matemática, que está em discussão pública até 12 de outubro, sendo que os comentários e sugestões devem ser enviados para a Direção Geral da Educação para o endereço dsdc@dge.mec.pt.
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No âmbito do estudo TIMSS 2015,
foi realizada uma análise sobre a evolução dos programas de Matemática e de
Ciências dos 4.º e 8.º anos de escolaridade dos países que participaram neste
estudo internacional, nos últimos 20 anos, de 1995 a 2015 (Mullis, Martin, & Loveless, 2016). Neste período de tempo,
verificou-se que, em todos os países, os currículos sofreram reajustes ou foram
reformulados. Na mesma linha, o relatório Eurydice (2012a) adianta que as
revisões curriculares garantem a sua adequação às necessidades da sociedade e
do mercado de trabalho:
Todos os países possuem um processo de revisão dos documentos
orientadores que tem em conta vários dados e pareceres, incluindo os resultados
da avaliação de alunos e as conclusões da avaliação das escolas. Este processo
de revisão assegura que os conteúdos, os objetivos e os resultados da
aprendizagem desta disciplina estão à altura dos desafios da sociedade moderna
e das competências de que o mercado de trabalho necessita. (Eurydice, 2012, p.
27)
No que respeita à Matemática, é
atribuído a este processo de revisão um caráter regular com o propósito de
avaliar o currículo: “A revisão regular do currículo de Matemática e a
monitorização do ensino e aprendizagem desta disciplina pretendem contribuir
para verificar a pertinência dos objetivos educativos e assegurar que estão a
ser obtidos os resultados desejados” (Eurydice, 2012, p. 31).
Neste processo de revisão, que
para Portugal se refere ao Programa de 2007 (Ponte et al., 2007), as mudanças
operadas na primeira década do século evidenciam a tendência generalizada da
redução dos conteúdos matemáticos a estudar, passando a abordá-los de forma
integrada:
Devido às revisões recentemente efetuadas, o conteúdo do currículo
de matemática foi reduzido em muitos países. Além disso, os conteúdos dos
planos de estudo sofreram igualmente uma transformação, deixando de ser uma
lista de conceitos matemáticos específicos para dar lugar a um sistema
integrado que desenvolve as capacidades de resolução de problemas utilizando princípios
matemáticos. Na Estónia, Grécia, França, Itália, Portugal e Reino Unido, os
novos currículos passaram, além disso, a incidir mais nas ligações
transcurriculares e na interação da matemática com a filosofia, as ciências e a
tecnologia. A ideia de que o conteúdo e as competências adquiridas na
matemática servem de base à aprendizagem de outras disciplinas escolares também
se generalizou. (Eurydice, 2012, p. 33)
Para além desta tendência, também
é destacada outra igualmente generalizada, o de serem consideradas aptidões (skills) e competências (competences) matemáticas nos documentos
curriculares, podendo-se encontrar nalguns deles referência a orientações
metodológicas, como no caso de Portugal:
As competências matemáticas essenciais são mencionadas, pelo menos
em termos gerais, no currículo ou noutros documentos orientadores, em quase
todos os países europeus. Em quase metade dos sistemas educativos, apenas se
fazem referências de caráter geral, mas em alguns deles (Dinamarca, Portugal e Listenstaine)
também se sugerem métodos pedagógicos específicos para serem usados enquanto se
ensinam tais aptidões o ensino de tais competências. (Eurydice, 2012b, p. 38)
Em 2015, muito embora continue a
haver grande diversidade nos países em análise, em termos de orientações
curriculares foram encontradas “mais semelhanças do que diferenças” (Mullis, Martin, & Loveless, 2016, p. 25). Em particular, os
resultados deste estudo evidenciam semelhanças ao nível de: (i) quando se
inicia o estudo da Matemática, (ii) integração das TIC, enquanto recurso
importante para a aprendizagem matemática; (iii) capacidades matemática a
privilegiar; e (iv) temas matemáticos a estudar.
Na maior parte dos países, a
abordagem da Matemática inicia-se na Educação Pré-Escolar. É na tecnologia que
se faz sentir a mudança mais alargada: “A mudança mais difundida nos currículos
de Matemática e Ciências entre os países nas últimas duas décadas é a
integração quase universal da tecnologia nos currículos dos países” (Mullis, Martin, & Loveless, 2016, p. 26).
Cerca de 90% dos programas de 2015
dos países envolvidos no estudo relatam iniciativas para integrar a tecnologia
no ensino e na aprendizagem da Matemática. Cerca de 80% dos países possuem
medidas específicas tendo em vista a introdução da tecnologia no currículo de
Matemática no 4.º ano. No 8.º ano, 93% dos países têm orientações para a
integração da tecnologia nos currículos de Matemática.
No que diz respeito às
capacidades, é dada grande importância à resolução de problemas e ao raciocínio/pensamento
matemático. A maioria dos países que participou nos TIMSS 1995 e 2015
considerou nos respetivos currículos em vigor em 2015, para além da resolução
de problemas, as capacidades de raciocínio e de comunicação, o que não
acontecia em 1995 (Mullis, Martin, & Loveless, 2016). A comunicação matemática é uma competência a
desenvolver em “quase todos os currículos e/ou documentos de orientação”
(Eurydice, 2012a, p. 60). A memorização embora, com menos relevância nos
currículos, continua a ser amplamente usada. A relação entre estratégias de
memorização e resultados “sugere que, ou a memorização constitui uma estratégia
ineficaz para a aprendizagem da Matemática, ou que os alunos mais fracos têm
maior tendência para a utilizar” (Eurydice, 2012a, p. 61).
A Álgebra e a Geometria são os
temas matemáticos que mais se destacam nos currículos. Para além disso,
constata-se que foi antecipada a relevância do tema Tratamento ou Processamento
de Dados e Estatística, passando a fazer frequentemente parte dos temas
matemáticos do 4.º ano. Neste ano de escolaridade, três quartos dos países
mencionam nos seus programas a necessidade de ler, interpretar e avaliar
tabelas, gráficos de barras, pictogramas e gráficos circulares.
Por último, em 1995, o desenvolvimento de
atitudes positivas era considerado um objetivo de aprendizagem. Em 2015, “não é
dado um lugar proeminente às atitudes” (Mullis, Martin, & Loveless, 2016, p. 33) e o tipo de atitudes que surgem nos programas é muito
variado, considerando tanto atitudes focadas na relação com a Matemática com
outras mais gerais (por ex. perseverança, confiança, apreciação da beleza da
Matemática, predisposição produtiva face à Matemática).
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