Neste Ano Internacional da Física [2005] fala-se
muito de Albert Einstein e das descobertas fundamentais que fizeram a Ciência
avançar mais um passo de gigante. Fala-se e com justiça. Mas fala-se quase só
do cientista e talvez se devesse também falar bastante mais do professor, do
pensador, do militante ou simplesmente do cidadão. Num interessante livro que
eu penso não ter sido ainda traduzido para português, “Ideas and Opinions”,
encontramos muitas opiniões expressas por Einstein nas mais diversas ocasiões,
desde artigos de jornal a respostas a questões de alunos de escolas que se lhe
dirigiam, passando por cartas e conferências de divulgação; essas opiniões vão
desde o significado da vida à influência de cientistas como Marie Curie, Lorentz,
Kepler ou Maxwell, passando pelos problemas da paz mundial ou pelo papel do
sionismo.
Curiosamente (ou talvez não), muitas das
considerações de Einstein sobre o ensino em geral e sobre a Matemática em
particular revelam uma atualidade gritante, pelo que não resisto em referir
algumas. Einstein achava que na escola se devia prioritariamente desenvolver a
“capacidade geral para o pensamento e julgamento independentes” em contraste
com a aquisição de conhecimentos particulares: “Se uma pessoa domina o que é
fundamental no seu assunto e aprendeu a pensar e a trabalhar de forma
independente, ele seguramente encontrará o seu caminho e além do mais será
capaz de se adaptar melhor ao progresso e mudanças que a pessoa cujo treino
consistiu principalmente em adquirir conhecimentos detalhados.”
No que diz respeito às metodologias de ensino,
Einstein não podia ser mais claro: “As personalidades não são formadas por
aquilo que é ouvido e dito, mas pelo trabalho e atividade. Assim, o método
mais importante de educação consistiu sempre em que o estudante era chamado a
uma atividade efetiva. Isto aplica-se tanto às primeiras tentativas de
escrever do rapaz na escola primária como à tese de doutoramento na graduação
pela universidade, ou à mera memorização de um poema, a redação de uma
composição, à interpretação e tradução de um texto, à resolução de um problema
de matemática ou à prática de um desporto físico.” Porque é que os professores
que recorrem quase exclusivamente ao método expositivo não se inspiram nos textos
de Einstein? Como o extrato se reporta a uma conferência proferida em 1936,
não o poderão certamente acusar de ser adepto de modernices.
Einstein também reflectiu sobre o papel
peculiar da matemática na ciência e no ensino: “Uma razão pela qual a matemática
goza de estima especial, acima de todas as outras ciências, é que as suas
proposições são absolutamente certas e indisputáveis, enquanto que as das
outras ciências são até certo ponto discutíveis e em perigo constante de ser
descartadas por factos acabados de descobrir. Apesar disto, o investigador
noutro departamento de ciências não precisaria de invejar o matemático se as
proposições da matemática se referissem a objetos da nossa mera imaginação, e
não a objetos da realidade. (...) Mas
existe outra razão para a alta reputação da matemática, em que é a matemática
que fornece às ciências exatas naturais uma certa medida de certeza, que não
poderiam atingir sem a matemática.” Mas chama a atenção, não vão os matemáticos
e professores de Matemática distrair-se, que “a Matemática em geral e
particularmente a Geometria, deve a sua existência à necessidade que foi
sentida de aprender algo sobre o comportamento dos objectos reais.” Esta
simbiose entre o abstrato e o real, com o real a precisar do abstrato para se
poder compreender melhor e o abstrato a ir buscar a sua razão de ser e
inspiração ao real, deveria permear todo o ensino da Matemática, e até é um dos
vectores fundamentais dos atuais programas de Matemática do ensino secundário,
mas continua a ter dificuldades em se concretizar plenamente, com consequências
negativas sobre a eficácia do ensino da Matemática.
(texto publicado pela primeira vez no jornal A Página da Educação, N. 151, Dezembro 2005)