quinta-feira, 1 de agosto de 2019

A Matemática no Ensino Profissional em Portugal


O ensino profissional em Portugal é alvo de escassas discussões e estudos, o que não deixa de ser surpreendente quando o objetivo de sucessivos governos tem sido o de atingir o nível de 50% dos alunos do ensino secundário a frequentar o ensino profissional.
O Grupo de Trabalho de Matemática foi constituído em 2018 pelo Despacho n.º 12530/2018, de 28 de dezembro para "proceder à análise do fenómeno do insucesso, tendo em vista a elaboração de um conjunto de recomendações sobre a disciplina de Matemática - ensino, aprendizagem e avaliação."
Aqui é reproduzido o capítulo 4 (p. 98-109) do documento Recomendações para a melhoria das aprendizagens dos alunos em Matemática (1.ª versão - 30 de junho de 2019), elaborado pelo Grupo de Trabalho de Matemática, que está em discussão pública até 12 de outubro, sendo que os comentários e sugestões devem ser enviados para a Direção Geral da Educação para o endereço dsdc@dge.mec.pt.

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Os cursos profissionais assumem uma importância cada vez maior no nosso sistema educativo, fazendo parte do “nível secundário de educação” desde a reforma do ensino secundário de 2004, ao mesmo nível dos Cursos Científico-Humanísticos, dos Cursos Artísticos Especializados e dos Cursos do Ensino Recorrente. Neste capítulo começamos por fazer uma breve caracterização destes cursos, de seguida apresentamos os respetivos programas de Matemática e, por último, passamos em revista as principais dificuldades detetadas nos relatórios e investigações que se debruçam sobre o ensino profissional, o que permitirá fundamentar algumas recomendações importantes.

4.1. O Ensino Profissional
O Ensino Profissional foi pela primeira vez apresentado como uma das componentes do “nível secundário de educação” no Decreto-Lei n.º 74/2004, de 26 de março. Aí é definido como incluindo cursos “vocacionados para a qualificação inicial dos alunos, privilegiando a sua inserção no mundo do trabalho e permitindo o prosseguimento de estudos”. Atualmente os cursos são regulamentados pelo Decreto-Lei n.º 55/2018 de 6 de julho, que mantém a mesma relevância dos Cursos Profissionais no nosso sistema educativo, a par com os Cursos Científico-Humanísticos, os Cursos Artísticos Especializados e os Cursos do Ensino Recorrente.
O Ensino Profissional tem sido prioridade em muitos Governos que declaram pretender atingir a fasquia de 50% de alunos do Ensino Secundário a frequentar cursos do Ensino Profissional (POCH 2020, 2019). Contudo, apesar desta meta ainda não ter sido atingida, verificou-se um aumento de mais de 40 000 alunos desde 2007/08 a 2016/17, tendo a percentagem de alunos a frequentar o Ensino Profissional atingido, em 2016/17, 32% dos alunos do Ensino Secundário.
O estudo recente da Direção Geral de Estatísticas da Educação e Ciência (DGEEC) (Fernandes, 2019) conclui que quase metade dos estudantes a frequentar os Cursos Profissionais pretende aceder ao Ensino Superior, como se pode observar na figura 1.

Nota: CCH: Curso Científico-Humanísticos, CP: Cursos Profissionais

Figura 1. Estudantes, por oferta de educação e formação e expetativas de percurso escolar, em percentagem (Fernandes, 2019, p. 20)

A maioria desses alunos pretende ingressar no Ensino Universitário (43,2%), um número muito superior aos que pretendem ingressar no Ensino Politécnico (15,1%) e mesmo maior do que aqueles que pretendem ingressar em Cursos Técnicos Superiores Profissionais (32,1%) (figura 2).

Figura 2. Estudantes, por oferta de educação e formação e formação esperada no pós-secundário, em percentagem (Fernandes, 2019, p. 22)

Segundo Rodrigues (2015), apesar de haver um grande número de alunos a procurar o Ensino Profissional como uma alternativa de ensino, tendo em vista a inserção na vida ativa, há alunos que optam por um Curso Profissional como um meio alternativo para conseguirem ingressar no Ensino Superior:
(…) embora a grande maioria dos alunos ingresse no ensino profissional à procura de uma alternativa de ensino diferente e mais adaptada à inserção no mundo de trabalho, há uma percentagem de alunos que lutam pelo ingresso ao ensino superior, preparando-se para os exames nacionais à disciplina de Matemática B (e por vezes Matemática A), sendo o curso profissional um meio para atingirem um objetivo, quer pela obtenção da média de acesso, quer pelas competências técnicas adquiridas no âmbito da licenciatura que pretendem. (Rodrigues, 2015, p. 133)

No entanto, apesar do número tão elevado de alunos dos Cursos Profissionais que pretende candidatar-se ao Ensino Superior, a legislação não prevê um acesso diferente do dos restantes alunos, limitando-se a sugerir que podem candidatar-se como alunos autopropostos aos exames nacionais das disciplinas necessárias para ingresso no Ensino Superior: “Os alunos dos cursos regulados pela presente portaria podem candidatar-se, na qualidade de alunos autopropostos, à realização de exames finais nacionais que elegerem como provas de ingresso para acesso ao Ensino superior” (Portaria n.º 235-A/2018, art. 28.º, ponto 3, p. 4342).
Este sistema “empurra” para alunos “autopropostos” (na realidade, sem outra alternativa) os alunos dos Cursos Profissionais que quiserem aceder ao Ensino Superior, não estabelecendo qualquer relação direta entre o Ensino Profissional e o sistema de acesso ao Ensino Superior. Apesar de o artigo 11.º do Decreto-Lei n.º 74/2004, de 26 de Março prever exames nacionais especificamente para acesso ao Enino Superior dos alunos dos Cursos Profissionais[1], estes nunca foram concretizados[2]. Os exames que os alunos dos Cursos Profissionais são atualmente obrigados a fazer não correspondem ao estudado pelos alunos, mas são sim determinados pelo que cada curso do Ensino Superior exige como prova de ingresso aos alunos dos Cursos Científico-Humanísticos, mesmo que os alunos dos Cursos Profissionais não tenham frequentado a respetiva disciplina. Não são necessários exames para ingressar nos recentemente criados Cursos Técnicos Superiores Profissionais no Ensino Superior, mas estes ainda não se impuseram aos estudantes como alternativa real, pois os alunos continuam a não lhes dar preferência.
Apesar de não haver resultados publicados do Projeto Garantia da Qualidade na Educação e Formação Profissional da Agência Nacional para a Qualificação e o Ensino Profissional, consultada a Escola Profissional de Ourém fomos informados que, entre 2014 e 2018, uma taxa que atingiu 32% dos alunos dessa escola, prosseguiu efetivamente estudos no Ensino Superior (quer em licenciaturas, quer em Cursos Técnicos Superiores Profissionais)[3]. Isto significa que, apesar de cerca de 90% dos alunos pretender prosseguir estudos no Ensino Superior, apenas cerca de 32% o consegue efetivamente fazer.
No que se refere às escolhas das áreas de estudo que os jovens pretendem frequentar no Ensino Superior, verifica-se que são muito diversificadas (Figura 3), mas a relação com a Matemática é muito grande. Ou seja, áreas que exigem Matemática A (Ciências, Engenharia, Saúde e Ciências Sociais) representam mais de 50% das preferências dos alunos dos Cursos Profissionais (CP) em que pretendem ingressar no Ensino Superior.

Figura 3.: Estudantes, por oferta de educação e formação e a área de estudo pretendida, em percentagem (Fernandes, 2019, p. 24)

Contudo, em 2013, a disciplina de Matemática B deixou de dar acesso aos Cursos de Ciências, Engenharia e Economia (Portaria n.º 1031/2009, com efeitos a partir do ano letivo de 2012/13). Assim, aos alunos que pretendem aceder aos Cursos de Ciências, Engenharia e Economia resta a hipótese de fazer o exame de Matemática A como aluno autoproposto, o que se afigura uma tarefa extremamente difícil para alunos dos Cursos Profissionais, atendendo à diferença de programas e cargas horárias das respetivas disciplinas.
O estudo de Oliveira das Neves et al. (2010) realça o facto de os Cursos Profissionais serem pouco atrativos para as famílias e para os alunos e que um dos fatores é o facto de haver menos articulação destes cursos com o Ensino Superior: “Os Cursos Profissionais se articulam com o Ensino Superior, em geral, pior que os Cursos Científico-Humanísticos” (Oliveira das Neves et al., 2010, p. 102).
A estrutura do ensino profissional foi alterada em 2004, conforme o estipulado no Decreto-Lei n.º 74/2004, de 26 de Março. Desde o lançamento das Escolas Profissionais em 1989, que a estrutura curricular e os programas (de estrutura modular) não eram alterados. Um intervalo temporal de quinze anos permitiu identificar melhorias a introduzir no modelo, sendo a estrutura, funcionamento e avaliação reorganizadas.

4.2. O Programa de Matemática dos Cursos Profissionais
O Programa da disciplina de Matemática da componente de Formação Científica dos Cursos Profissionais de Nível Secundário foi homologado em 3 de março de 2005, e foi entrando em vigor para os cursos que foram homologados depois dessa data. É constituído por um só volume, de 87 páginas e foi redigido pela mesma equipa que elaborou o programa da disciplina de Matemática Aplicada às Ciências Sociais[4].
O programa desta disciplina define sete finalidades, sendo que cinco delas são idênticas às dos programas de Matemática de 1991. As duas inovações deste programa são a de desenvolver a “capacidade de selecionar a Matemática relevante para cada problema da realidade”, e a de
criar capacidades de intervenção social pelo estudo e compreensão de problemas e situações da sociedade atual e bem assim pela discussão de sistemas e instâncias de decisão que influenciam a vida dos cidadãos, participando desse modo na formação para uma cidadania ativa e participativa. (DGFV, 2004, p. 2)

Os objetivos gerais indicam que o essencial da aprendizagem da Matemática deve ser procurado ao nível das ideias para a resolução de problemas e para as aplicações da Matemática. O uso das ferramentas deve ser ensinado e aprendido no contexto das ideias e da resolução de problemas interessantes, enfim em situações que exijam o seu manejo e em que seja vantajoso o seu conhecimento, privilegiando mesmo características típicas do ensino experimental.
O Programa propõe que o ensino de todos os temas seja suportado em atividades diversas, que contemplem:
a modelação matemática, o trabalho experimental e o estudo de situações realistas adequadas a cada curso sobre as quais se coloquem questões significativas, resolução de problemas não rotineiros e conexões entre temas matemáticos, aplicações da matemática noutras disciplinas e com relevância para interesses profissionais, recorrendo com frequência a ferramentas computacionais adequadas. (DGFV, 2004, p. 4).

Os conteúdos matemáticos são estruturados em módulos segundo o modelo curricular dos Cursos Profissionais, e são os seguintes: Números e Geometria, incluindo Trigonometria; Funções reais e Análise infinitesimal; Estatística e probabilidades; e, Matemática discreta. Para além destes temas, as Aplicações e Modelação Matemática constituem um tema transversal a ser presente em todos os módulos.
Os conteúdos estão distribuídos por um conjunto de dezasseis módulos, divididos em duas categorias A e B, sendo estes últimos destinados aos cursos com menor carga horária:
Assim, a lista de módulos desta disciplina é constituída por dois grupos. O grupo de módulos A corresponde ao elenco destinado aos cursos cuja carga horária da disciplina é de 300 horas. Os módulos do grupo B destinam-se a ser combinados com módulos [do grupo] A, para a formação dos estudantes em cursos menos exigentes em carga horária. Este grupo de módulos B inclui temas menos aprofundados ou variações em relação aos temas tratados nos módulos A, por forma a responder mais adequadamente às exigências de formação decorrentes das famílias profissionais em que os cursos de enquadram. (DGFV, 2004, p. 3)

Os quadros resumo da lista de módulos oferecidos no referido programa podem ser observados nas figuras 4 e 5.
Figura 4. Lista e resumo dos módulos A (DGFV, 2004, p. 3)

Figura 5. Lista e resumo dos módulos B (DGFV, 2004, p. 4)

O programa considera necessário que:
(…) no primeiro módulo do programa de cada curso, os estudantes sejam colocados perante a resolução de problemas escolhidos que permitam despistar dificuldades e deficiências na formação básica. A estratégia assente na resolução de problemas evita que os estudantes sejam desgastados em revisitações expositivas de assuntos que podem até já dominar (DGFV, 2004, p. 4).
A orientação metodológica baseia-se no princípio de as aplicações e os problemas extraídos do mundo real e das profissões estarem no centro do programa. As aplicações integradas num contexto significativo para os estudantes, são usadas como ponto de partida para cada novo assunto, sendo parte do processo de construção de conceitos matemáticos dos estudantes e usadas como fonte de exercícios.
Relativamente aos recursos, o uso de tecnologias de cálculo, com capacidades gráficas e de comunicação, é considerado fundamental para a criação e o desenvolvimento de competências úteis a todos os desempenhos profissionais, recomendando-se que se constituam Laboratórios de Matemática para que os estudantes possam ter oportunidade de trabalhar diretamente com um computador com regularidade. O uso de calculadoras gráficas é obrigatório.
Relativamente à avaliação, este programa pretende que “as situações de avaliação não se restrinjam ao produto final, mas atendam essencialmente ao processo de aprendizagem e permitam que o estudante seja um elemento ativo, reflexivo e responsável da sua aprendizagem” (DGFV, 2004, p. 8). Explicita que o professor “não deve reduzir as suas formas de avaliação aos testes escritos, antes deve diversificá-las” (DGFV, 2004, p. 8). O programa recomenda “que se usem redações matemáticas (sob a forma de resolução de problemas, composições/reflexões, projetos, relatórios ou outras) que reforcem a importante componente da comunicação matemática” (DGFV, 2004, p. 8). Recomenda também a “utilização de ‘testes em duas fases’ que permitem o desenvolvimento da persistência na procura de soluções para situações novas, para além de contribuírem para uma atitude de reflexão sobre a aprendizagem” (DGFV, 2004, p. 8).

4.3. Apreciação da evolução da Matemática no Ensino Profissional
O ensino da Matemática nos Cursos Profissionais tem-se revelado muito exigente, com uma variabilidade grande entre escolas, entre cursos e mesmo entre módulos. Num estudo de 2012, com uma amostra de 8 escolas (4 privadas e 4 públicas), concluiu-se que a taxa de aprovação variava entre 15% e 80%, com níveis de motivação dos estudantes muito variados (Carvalho e Silva, 2012).
Há poucos estudos que se debrucem diretamente sobre a Matemática nos Cursos Profissionais ou sobre o impacto dos atuais programas, que já datam de 2004. Mas aparecem alguns temas importantes que iremos passar em revista: a importância do trabalho colaborativo, a necessidade de uma formação contínua de professores adequada às necessidades dos Cursos Profissionais, a necessidade de apetrechamento das escolas e a revisão do atual currículo.

4.3.1. Trabalho colaborativo
A necessidade do aumento do trabalho colaborativo entre os professores tendo em vista a adequação dos objetivos da aprendizagem da Matemática à especialização de cada curso é um dos destaques do estudo de Rodrigues (2018):
Outro consenso presente na investigação é a importância da definição das equipas pedagógicas responsáveis pela formação dos alunos dos cursos profissionais, recomendando o aumento do trabalho colaborativo e a participação de todos na flexibilização curricular e adequação dos objetivos de aprendizagem à especialização técnica de cada curso, para que assim se vá ao encontro aos interesses dos alunos e ao futuro perfil profissional dos mesmos. (Rodrigues, 2018, p. 17)

Também o estudo de Filipe (2017) evidencia a importância do trabalho colaborativo entre os professores que lecionam no Ensino Profissional quando estão em causa as aplicações e a modelação matemática:
O trabalho colaborativo teve um papel crucial neste processo, pois permitiu a evolução do conhecimento para ensinar Estatística, porque houve necessidade de aprofundar o conhecimento não matemático ao estarem em contacto direto com a realidade, algo que não costuma ser hábito na prática de ensino de qualquer professor. (Filipe, 2017, p. 429)

Alexandra Rodrigues sugere como elemento chave para a adaptação da Matemática às várias áreas profissionais, o aumento do trabalho colaborativo entre os professores das várias disciplinas, cabendo às escolas a criação de tempos para o efeito:
Uma solução parece-nos ser a promoção de reuniões dos professores de Matemática com os professores da área técnica dos cursos, no sentido de promover a interdisciplinaridade e (…) a existência de “horas de articulação” nos programas da disciplina. (Rodrigues, 2015, p. 173)


4.3.2. Formação contínua de professores
Filipe (2017), nas conclusões da sua tese de doutoramento, chama a atenção para o facto de que ensinar em Cursos Profissionais é muito diferente do modo como se ensina no ensino regular, exigindo da parte dos professores outra maneira de trabalhar tanto na escolha das tarefas, como no modo como preparam e conduzem as aulas:
A prática usual é lecionar da mesma forma como o fazem no ensino regular, mas os alunos do ensino profissional têm outro perfil e, como tal, todas as tarefas e forma como se preparam e conduzem as aulas têm que ter outro “olhar” por parte dos professores, não se podendo esquecer que estão a preparar jovens para o mundo do trabalho e que a Matemática deve ser ensinada com base nos contextos reais. (Filipe, 2017, p. 432)

Igualmente Oliveira das Neves et al. (2010), no estudo da expansão das escolas profissionais às escolas secundárias públicas, realça a necessidade de implementar uma formação de professores direcionada especificamente aos professores dos Cursos Profissionais:
(…) sendo indispensável que seja assegurado: (…) a formação dos professores, através da adequação dinâmica das respostas de formação de aperfeiçoamento e reciclagem quer às necessidades específicas dos profissionais que lecionam os Cursos Profissionais, quer às necessidades de formação em apoio a estratégias de diversificação pedagógica. (Oliveira das Neves et al., 2010, p. 95)

No seu estudo, Filipe (2017) realça as dificuldades e as exigências para os professores quando ensinam nos Cursos Profissionais, mas acredita, fundamentando-se no seu trabalho de investigação, de que é possível tornar as aprendizagens matemáticas, dos alunos que frequentam o Ensino Profissional, ricas e significativas, desde que haja um verdadeiro investimento:
O ensino da Matemática nos cursos profissionais exige dos professores alguma criatividade perante a desmotivação generalizada dos alunos que integram estes cursos. Nem sempre é fácil criar e preparar tarefas que os motivem, os conduzam a desejar aprender e lhes permita valorizar a disciplina. Com este estudo, percebi que é possível mudar alguma coisa. Se as motivações e interesses dos alunos forem tidos em conta, com algum trabalho e vontade, os professores podem despertar estes alunos para a Matemática, proporcionando momentos de aprendizagem ricos e significativos. (Filipe, 2017, p. 431)

4.3.3. Recursos nas escolas
Reforçando esta necessidade de adaptação do programa de Matemática à especificidade de cada curso, Rodrigues (2015) concluiu que se verificaram algumas dificuldades da parte dos professores envolvidos no seu estudo em adaptarem a Matemática à parte técnica dos cursos, para o que poderá ter contribuído a inexistência de recursos e de formação nesta área:
Todos os professores afirmaram tentar adaptar a matemática ensinada à parte técnica dos cursos, confessando que têm algumas dificuldades nas aplicações práticas da matemática em alguns módulos. Neste âmbito torna-se evidente que não existe formação nesta área, e são praticamente inexistentes os recursos aos quais os professores possam recorrer para enriquecerem os seus conhecimentos sobre a matemática adequada. (Rodrigues, 2015, p. 169)

Ainda, com o objetivo de ultrapassar estas dificuldades, Rodrigues (2015) sugere a criação de equipas para desenvolverem materiais tendo em vista a sua adaptação à área técnica de cada curso:
(…) poderiam criar-se equipas para desenvolverem sebentas de apoio ao ensino de cada módulo dos programas de Matemática, com tarefas dirigidas a cada área de formação que integra o catálogo nacional de qualificações, reestruturando a carga horária dos módulos, de acordo com a sua importância relativa na área técnica de cada curso. (Rodrigues, 2015, p. 172)

Noutro estudo, também é evidenciada a necessidade do apetrechamento das escolas com equipamentos adequados, sendo um aspeto essencial para a credibilidade do Ensino Profissional a funcionar nas Escolas Secundárias:
O apetrechamento das Escolas assume uma importância que foi subvalorizada em experiências profissionalizantes passadas que envolveram Escolas Públicas e é essencial para a credibilização desta oferta nas Escolas Secundárias. (Oliveira das Neves et al., 2010, p. 95)

4.3.4. Revisão do currículo
Algumas áreas da Matemática assumem uma importância crescente no ensino em geral, mas especialmente no Ensino Profissional, como é o caso claramente da Estatística. Não só será necessário analisar quais os conhecimentos estatísticos necessários aos futuros profissionais, provavelmente alargando os módulos de Estatística atualmente oferecidos, como será preciso formar os professores para se prepararem com qualidade, em termos científicos e em termos didáticos, para os desafios educacionais necessários:
A formação nesta área da Estatística poderá ter um papel preponderante no ensino das distribuições bidimensionais, alertando para aspetos a serem trabalhados e identificados como problemáticos nesta experiência de ensino, e ou ainda, existirem mais equipas colaborativas que permitam uma maior partilha de conhecimentos e reflexão sobre as práticas. (Filipe, 2017, p. 430)

A investigação de Filipe (2017) prova que os desafios da Estatística são ultrapassáveis nos Cursos Profissionais.
Em síntese, num trabalho apresentado no Congresso Internacional de Educação Matemática de 2012, Carvalho e Silva (2012) propõe que se inicie o estudo da situação atual do Ensino da Matemática dos Cursos Profissionais com vista à revisão do currículo de Matemática que a análise aconselhar:
(...) estamos no momento certo para uma análise profunda da situação dos estudos vocacionais em Portugal de modo a fazer propostas concretas da revisão dos programas e também determinar os passos necessários a tomar nas escolas e no Ministério da Educação de modo a melhorar a situação. (Carvalho e Silva, 2012, p. 1842)


Referências
Carvalho e Silva, J. (2012). The mathematics teaching in Vocational schools in Portugal. ICMI. ICME-12 Preproceedings. (1. ed., v. 1, pp. 1838-1843). Seoul: ICMI.
DGFV — Direção Geral de Formação Vocacional (2004). Programa. Componente de formação científica. Disciplina de Matemática. Lisboa: Ministério da Educação.
Fernandes, S., Pereira, P., Duarte, J., & Canto e Castro, L. (2019). Estudantes à saída do Secundário em 2017/2018 (Dados provisórios). DGEEC - Direção de Estatísticas da Educação e Ciência.
Oliveira das Neves, A., Pereira, C., Santos, F., Godinho, R., & Pereira, T. (2010) Avaliação externa do impacto da expansão dos Cursos Profissionais no Sistema Nacional deQualificações. IESE. ANQ.
Rodrigues, A. (2015). A matemática no ensino profissional.Os programas e as representações dos professores. (Tese de Doutoramento, Universidade da Beira Interior)
Rodrigues, A. (2018). Ensino profissional: educar para o futuro. Atas do XXIX Seminário de Investigação em Educação Matemática. APM: Lisboa.
POCH 2020 (2019). OCDE destaca o papel do Ensino Profissional no combate ao abandono escolar. Obtido de  

Legislação
Decreto-Lei n.º 74/2004, de 26 de março, Diário da República n.º 73/2004, Série I-A de 2004-03-26.
Portaria n.º 1031/2009 de 10 de setembro, Diário da República n.º 176/2009, Série I de 2009-09-10.
Decreto-Lei n.º 55/2018 de 6 de julho, Diário da República n.º 129/2018, Série I de 2018-07-06.
Portaria n.º 235-A/2018 de 23 de agosto, Diário da República n.º 162/2018, 1º Suplemento, Série I de 2018-08-23.



[1] “Para a certificação da conclusão de um curso do ensino recorrente,  bem como de um curso profissional de nível secundário, não é obrigatória a aprovação nos exames nacionais, exceto nos casos em que o aluno pretenda prosseguir estudos de nível superior” (Decreto-Lei n.º 74/2004, art.º 15.º n.º 3).
[2] Em cumprimento do artigo 26.º da Portaria n.º 550-C/2004, o programa da disciplina de Matemática dos Cursos Profissionais chegou a estabelecer que as provas de exame incidiriam apenas sobre alguns dos módulos do programa (DGFV, 2004, p. 8).
[3] 2014 - 31%, 2015 – 11%, 2016 - 32%, 2017 – 26%, 2018 – 23% (comunicação pessoal).
[4] A equipa de autores é constituída por Arsélio de Almeida Martins, Cristina Maria Cruchinho da Fonseca, Ilda Maria Ferreira do Couto Lopes, Luísa da Conceição Santos Canto e Castro de Loura, Maria Eugénia Santos Lino Pires Graça Martins, Maria Graziela Esteves Carvalho Fonseca e Jaime Maria Monteiro Carvalho e Silva (que coordenou).

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