O ensino profissional em Portugal é alvo de escassas discussões e estudos, o que não deixa de ser surpreendente quando o objetivo de sucessivos governos tem sido o de atingir o nível de 50% dos alunos do ensino secundário a frequentar o ensino profissional.
O Grupo de Trabalho de Matemática foi constituído em 2018 pelo Despacho n.º 12530/2018, de 28 de dezembro para "proceder à análise do fenómeno do insucesso, tendo em vista a elaboração de um conjunto de recomendações sobre a disciplina de Matemática - ensino, aprendizagem e avaliação."
Aqui é reproduzido o capítulo 4 (p. 98-109) do documento Recomendações para a melhoria das aprendizagens dos alunos em Matemática (1.ª versão - 30 de junho de 2019), elaborado pelo Grupo de Trabalho de Matemática, que está em discussão pública até 12 de outubro, sendo que os comentários e sugestões devem ser enviados para a Direção Geral da Educação para o endereço dsdc@dge.mec.pt.
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Os cursos
profissionais assumem uma importância cada vez maior no nosso sistema
educativo, fazendo parte do “nível secundário de educação” desde a reforma do
ensino secundário de 2004, ao mesmo nível dos Cursos Científico-Humanísticos,
dos Cursos Artísticos Especializados e dos Cursos do Ensino Recorrente. Neste
capítulo começamos por fazer uma breve caracterização destes cursos, de seguida
apresentamos os respetivos programas de Matemática e, por último, passamos em
revista as principais dificuldades detetadas nos relatórios e investigações que
se debruçam sobre o ensino profissional, o que permitirá fundamentar algumas
recomendações importantes.
4.1. O Ensino Profissional
O Ensino Profissional foi pela primeira vez apresentado como uma das
componentes do “nível secundário de educação” no Decreto-Lei n.º 74/2004, de 26
de março. Aí é definido como incluindo cursos “vocacionados para a qualificação
inicial dos alunos, privilegiando a sua inserção no mundo do trabalho e
permitindo o prosseguimento de estudos”. Atualmente os cursos são
regulamentados pelo Decreto-Lei n.º 55/2018 de 6 de julho, que mantém a mesma
relevância dos Cursos Profissionais no nosso sistema educativo, a par com os Cursos
Científico-Humanísticos, os Cursos Artísticos Especializados e os Cursos do
Ensino Recorrente.
O Ensino
Profissional tem sido prioridade em muitos Governos que declaram pretender atingir
a fasquia de 50% de alunos do Ensino Secundário a frequentar cursos do Ensino Profissional
(POCH 2020, 2019). Contudo, apesar desta meta ainda não ter sido atingida,
verificou-se um aumento de mais de 40 000 alunos desde 2007/08 a 2016/17, tendo
a percentagem de alunos a frequentar o Ensino Profissional atingido, em
2016/17, 32% dos alunos do Ensino Secundário.
O estudo recente
da Direção Geral de Estatísticas da Educação e Ciência (DGEEC) (Fernandes, 2019)
conclui que quase metade dos estudantes a frequentar os Cursos Profissionais
pretende aceder ao Ensino Superior, como se pode observar na figura 1.
Nota: CCH: Curso Científico-Humanísticos, CP: Cursos
Profissionais
Figura 1.
Estudantes, por oferta de educação e formação e expetativas de percurso escolar,
em percentagem (Fernandes, 2019, p. 20)
A maioria desses
alunos pretende ingressar no Ensino Universitário (43,2%), um número muito
superior aos que pretendem ingressar no Ensino Politécnico (15,1%) e mesmo
maior do que aqueles que pretendem ingressar em Cursos Técnicos Superiores
Profissionais (32,1%) (figura 2).
Figura 2.
Estudantes, por oferta de educação e formação e formação esperada no
pós-secundário, em percentagem (Fernandes, 2019, p. 22)
Segundo Rodrigues (2015), apesar de haver um grande número de alunos a
procurar o Ensino Profissional como uma alternativa de ensino, tendo em vista a
inserção na vida ativa, há alunos que optam por um Curso Profissional como um
meio alternativo para conseguirem ingressar no Ensino Superior:
(…) embora a grande maioria dos alunos ingresse no ensino
profissional à procura de uma alternativa de ensino diferente e mais adaptada à
inserção no mundo de trabalho, há uma percentagem de alunos que lutam pelo
ingresso ao ensino superior, preparando-se para os exames nacionais à
disciplina de Matemática B (e por vezes Matemática A), sendo o curso
profissional um meio para atingirem um objetivo, quer pela obtenção da média de
acesso, quer pelas competências técnicas adquiridas no âmbito da licenciatura
que pretendem. (Rodrigues, 2015, p. 133)
No entanto, apesar
do número tão elevado de alunos dos Cursos Profissionais que pretende candidatar-se
ao Ensino Superior, a legislação não prevê um acesso diferente do dos restantes
alunos, limitando-se a sugerir que podem candidatar-se como alunos
autopropostos aos exames nacionais das disciplinas necessárias para ingresso no
Ensino Superior: “Os alunos dos cursos regulados pela presente portaria podem
candidatar-se, na qualidade de alunos autopropostos, à realização de exames
finais nacionais que elegerem como provas de ingresso para acesso ao Ensino
superior” (Portaria
n.º 235-A/2018, art. 28.º, ponto 3, p. 4342).
Este sistema “empurra”
para alunos “autopropostos” (na realidade, sem outra alternativa) os alunos dos
Cursos Profissionais que quiserem aceder ao Ensino Superior, não estabelecendo
qualquer relação direta entre o Ensino Profissional e o sistema de acesso ao
Ensino Superior. Apesar de o artigo 11.º do Decreto-Lei n.º 74/2004, de 26 de
Março prever exames nacionais especificamente para acesso ao Enino Superior dos
alunos dos Cursos Profissionais[1], estes nunca foram
concretizados[2]. Os
exames que os alunos dos Cursos Profissionais são atualmente obrigados a fazer não
correspondem ao estudado pelos alunos, mas são sim determinados pelo que cada
curso do Ensino Superior exige como prova de ingresso aos alunos dos Cursos
Científico-Humanísticos, mesmo que os alunos dos Cursos Profissionais não tenham
frequentado a respetiva disciplina. Não são necessários exames para ingressar
nos recentemente criados Cursos Técnicos Superiores Profissionais no Ensino
Superior, mas estes ainda não se impuseram aos estudantes como alternativa real,
pois os alunos continuam a não lhes dar preferência.
Apesar de não
haver resultados publicados do Projeto Garantia da Qualidade na Educação e
Formação Profissional da Agência Nacional para a Qualificação e o Ensino
Profissional, consultada a Escola Profissional de Ourém fomos informados que,
entre 2014 e 2018, uma taxa que atingiu 32% dos alunos dessa escola, prosseguiu
efetivamente estudos no Ensino Superior (quer em licenciaturas, quer em Cursos
Técnicos Superiores Profissionais)[3]. Isto significa que,
apesar de cerca de 90% dos alunos pretender prosseguir estudos no Ensino
Superior, apenas cerca de 32% o consegue efetivamente fazer.
No que se
refere às escolhas das áreas de estudo que os jovens pretendem frequentar no Ensino
Superior, verifica-se que são muito diversificadas (Figura 3), mas a relação com a
Matemática é muito grande. Ou seja, áreas que exigem Matemática A (Ciências,
Engenharia, Saúde e Ciências Sociais) representam mais de 50% das preferências
dos alunos dos Cursos Profissionais (CP) em que pretendem ingressar no Ensino Superior.
Figura 3.: Estudantes,
por oferta de educação e formação e a área de estudo pretendida, em percentagem
(Fernandes, 2019, p. 24)
Contudo, em
2013, a disciplina de Matemática B deixou de dar acesso aos Cursos de Ciências,
Engenharia e Economia (Portaria n.º 1031/2009, com efeitos a partir do ano
letivo de 2012/13). Assim, aos alunos que pretendem aceder aos Cursos de
Ciências, Engenharia e Economia resta a hipótese de fazer o exame de Matemática
A como aluno autoproposto, o que se afigura uma tarefa extremamente difícil
para alunos dos Cursos Profissionais, atendendo à diferença de programas e
cargas horárias das respetivas disciplinas.
O estudo de
Oliveira das Neves et al. (2010) realça o facto de os Cursos Profissionais serem
pouco atrativos para as famílias e para os alunos e que um dos fatores é o facto
de haver menos articulação destes cursos com o Ensino Superior: “Os Cursos
Profissionais se articulam com o Ensino Superior, em geral, pior que os Cursos
Científico-Humanísticos” (Oliveira das Neves et al., 2010, p. 102).
A estrutura do
ensino profissional foi alterada em 2004, conforme o estipulado no Decreto-Lei
n.º 74/2004, de 26 de Março. Desde o lançamento das Escolas Profissionais em
1989, que a estrutura curricular e os programas (de estrutura modular) não eram
alterados. Um intervalo temporal de quinze anos permitiu identificar melhorias
a introduzir no modelo, sendo a estrutura, funcionamento e avaliação
reorganizadas.
4.2. O Programa de Matemática dos
Cursos Profissionais
O Programa da
disciplina de Matemática da componente de Formação Científica dos Cursos
Profissionais de Nível Secundário foi homologado em 3 de março de 2005, e foi
entrando em vigor para os cursos que foram homologados depois dessa data. É constituído
por um só volume, de 87 páginas e foi redigido pela mesma equipa que elaborou o
programa da disciplina de Matemática Aplicada às Ciências Sociais[4].
O programa
desta disciplina define sete finalidades,
sendo que cinco delas são idênticas às dos programas de Matemática de 1991. As
duas inovações deste programa são a de desenvolver a “capacidade de selecionar
a Matemática relevante para cada problema da realidade”, e a de
criar capacidades de intervenção social pelo estudo e
compreensão de problemas e situações da sociedade atual e bem assim pela
discussão de sistemas e instâncias de decisão que influenciam a vida dos
cidadãos, participando desse modo na formação para uma cidadania ativa e
participativa. (DGFV, 2004, p. 2)
Os objetivos
gerais indicam que o essencial da aprendizagem da Matemática deve ser
procurado ao nível das ideias para a resolução de problemas e para as
aplicações da Matemática. O uso das ferramentas deve ser ensinado e aprendido
no contexto das ideias e da resolução de problemas interessantes, enfim em
situações que exijam o seu manejo e em que seja vantajoso o seu conhecimento,
privilegiando mesmo características típicas do ensino experimental.
O Programa propõe que o ensino de todos os temas seja suportado em atividades diversas,
que contemplem:
a modelação matemática,
o trabalho experimental e o estudo de situações realistas adequadas a cada
curso sobre as quais se coloquem questões significativas, resolução de
problemas não rotineiros e conexões entre temas matemáticos, aplicações da
matemática noutras disciplinas e com relevância para interesses profissionais,
recorrendo com frequência a ferramentas computacionais adequadas. (DGFV, 2004,
p. 4).
Os conteúdos matemáticos são estruturados em
módulos segundo o modelo curricular dos Cursos Profissionais, e são os
seguintes: Números e Geometria, incluindo Trigonometria; Funções reais e Análise
infinitesimal; Estatística e probabilidades; e, Matemática discreta. Para além destes
temas, as Aplicações e Modelação
Matemática constituem um tema transversal a ser presente em todos os
módulos.
Os conteúdos
estão distribuídos por um conjunto de dezasseis módulos, divididos em duas
categorias A e B, sendo estes últimos destinados aos cursos com menor carga
horária:
Assim, a lista de módulos desta
disciplina é constituída por dois grupos. O grupo de módulos A corresponde ao
elenco destinado aos cursos cuja carga horária da disciplina é de 300 horas. Os
módulos do grupo B destinam-se a ser combinados com módulos [do grupo] A, para
a formação dos estudantes em cursos menos exigentes em carga horária. Este
grupo de módulos B inclui temas menos aprofundados ou variações em relação aos
temas tratados nos módulos A, por forma a responder mais adequadamente às
exigências de formação decorrentes das famílias profissionais em que os cursos
de enquadram. (DGFV, 2004, p. 3)
Os quadros
resumo da lista de módulos oferecidos no referido programa podem ser observados
nas figuras 4 e 5.
Figura 4. Lista e resumo dos
módulos A (DGFV, 2004, p. 3)
Figura 5. Lista e resumo dos
módulos B (DGFV, 2004, p. 4)
O programa considera necessário que:
(…) no primeiro módulo
do programa de cada curso, os estudantes sejam colocados perante a resolução de
problemas escolhidos que permitam despistar dificuldades e deficiências na
formação básica. A estratégia assente na resolução de problemas evita que os
estudantes sejam desgastados em revisitações expositivas de assuntos que podem
até já dominar (DGFV, 2004, p. 4).
A orientação metodológica baseia-se no
princípio de as aplicações e os problemas extraídos do mundo real e das
profissões estarem no centro do programa. As aplicações integradas num contexto
significativo para os estudantes, são usadas como ponto de partida para cada
novo assunto, sendo parte do processo de construção de conceitos matemáticos
dos estudantes e usadas como fonte de exercícios.
Relativamente aos recursos,
o uso de tecnologias de cálculo, com capacidades gráficas e de comunicação, é considerado
fundamental para a criação e o desenvolvimento de competências úteis a todos os
desempenhos profissionais, recomendando-se que se constituam Laboratórios de Matemática para que os
estudantes possam ter oportunidade de trabalhar diretamente com um computador com
regularidade. O uso de calculadoras gráficas é obrigatório.
Relativamente à
avaliação, este programa pretende que “as situações de avaliação não se
restrinjam ao produto final, mas atendam essencialmente ao processo de
aprendizagem e permitam que o estudante seja um elemento ativo, reflexivo e
responsável da sua aprendizagem” (DGFV, 2004, p. 8). Explicita que o professor
“não deve reduzir as suas formas de avaliação aos testes escritos, antes deve
diversificá-las” (DGFV, 2004, p. 8). O programa recomenda “que se usem redações
matemáticas (sob a forma de resolução de problemas, composições/reflexões,
projetos, relatórios ou outras) que reforcem a importante componente da
comunicação matemática” (DGFV, 2004, p. 8). Recomenda também a “utilização de ‘testes
em duas fases’ que permitem o desenvolvimento da persistência na procura de
soluções para situações novas, para além de contribuírem para uma atitude de
reflexão sobre a aprendizagem” (DGFV, 2004, p. 8).
4.3. Apreciação da evolução da
Matemática no Ensino Profissional
O ensino da Matemática nos Cursos Profissionais tem-se revelado muito
exigente, com uma variabilidade grande entre escolas, entre cursos e mesmo
entre módulos. Num estudo de 2012, com uma amostra de 8 escolas (4 privadas e 4
públicas), concluiu-se que a taxa de aprovação variava entre 15% e 80%, com
níveis de motivação dos estudantes muito variados (Carvalho e Silva, 2012).
Há poucos
estudos que se debrucem diretamente sobre a Matemática nos Cursos Profissionais
ou sobre o impacto dos atuais programas, que já datam de 2004. Mas aparecem
alguns temas importantes que iremos passar em revista: a importância do
trabalho colaborativo, a necessidade de uma formação contínua de professores
adequada às necessidades dos Cursos Profissionais, a necessidade de
apetrechamento das escolas e a revisão do atual currículo.
4.3.1. Trabalho colaborativo
A necessidade
do aumento do trabalho colaborativo
entre os professores tendo em vista a adequação dos objetivos da aprendizagem
da Matemática à especialização de cada curso é um dos destaques do estudo de Rodrigues
(2018):
Outro consenso presente na
investigação é a importância da definição das equipas pedagógicas responsáveis
pela formação dos alunos dos cursos profissionais, recomendando o aumento do
trabalho colaborativo e a participação de todos na flexibilização curricular e
adequação dos objetivos de aprendizagem à especialização técnica de cada curso,
para que assim se vá ao encontro aos interesses dos alunos e ao futuro perfil
profissional dos mesmos. (Rodrigues, 2018, p. 17)
Também o
estudo de Filipe (2017) evidencia a importância do trabalho colaborativo entre os professores que lecionam no Ensino
Profissional quando estão em causa as aplicações e a modelação matemática:
O trabalho colaborativo teve um papel crucial neste
processo, pois permitiu a evolução do conhecimento para ensinar Estatística,
porque houve necessidade de aprofundar o conhecimento não matemático ao estarem
em contacto direto com a realidade, algo que não costuma ser hábito na prática
de ensino de qualquer professor. (Filipe, 2017, p. 429)
Alexandra
Rodrigues sugere como elemento chave para a adaptação da Matemática às várias
áreas profissionais, o aumento do trabalho
colaborativo entre os professores das várias disciplinas, cabendo às
escolas a criação de tempos para o efeito:
Uma solução parece-nos ser a promoção
de reuniões dos professores de Matemática com os professores da área técnica
dos cursos, no sentido de promover a interdisciplinaridade e (…) a existência
de “horas de articulação” nos programas da disciplina. (Rodrigues, 2015, p.
173)
4.3.2. Formação contínua de professores
Filipe (2017),
nas conclusões da sua tese de doutoramento, chama a atenção para o facto de que
ensinar em Cursos Profissionais é muito diferente do modo como se ensina no
ensino regular, exigindo da parte dos professores outra maneira de trabalhar
tanto na escolha das tarefas, como no modo como preparam e conduzem as aulas:
A prática usual é lecionar da
mesma forma como o fazem no ensino regular, mas os alunos do ensino
profissional têm outro perfil e, como tal, todas as tarefas e forma como se
preparam e conduzem as aulas têm que ter outro “olhar” por parte dos
professores, não se podendo esquecer que estão a preparar jovens para o mundo
do trabalho e que a Matemática deve ser ensinada com base nos contextos reais.
(Filipe, 2017, p. 432)
Igualmente
Oliveira das Neves et al. (2010), no estudo da expansão das escolas
profissionais às escolas secundárias públicas, realça a necessidade de
implementar uma formação de professores direcionada especificamente aos
professores dos Cursos Profissionais:
(…) sendo indispensável que seja
assegurado: (…) a formação dos professores, através da adequação dinâmica das
respostas de formação de aperfeiçoamento e reciclagem quer às necessidades
específicas dos profissionais que lecionam os Cursos Profissionais, quer às
necessidades de formação em apoio a estratégias de diversificação pedagógica.
(Oliveira das Neves et al., 2010, p. 95)
No seu estudo,
Filipe (2017) realça as dificuldades e as exigências para os professores quando
ensinam nos Cursos Profissionais, mas acredita, fundamentando-se no seu
trabalho de investigação, de que é possível tornar as aprendizagens
matemáticas, dos alunos que frequentam o Ensino Profissional, ricas e
significativas, desde que haja um verdadeiro investimento:
O ensino da Matemática nos cursos profissionais exige dos
professores alguma criatividade perante a desmotivação generalizada dos alunos
que integram estes cursos. Nem sempre é fácil criar e preparar tarefas que os
motivem, os conduzam a desejar aprender e lhes permita valorizar a disciplina.
Com este estudo, percebi que é possível mudar alguma coisa. Se as motivações e
interesses dos alunos forem tidos em conta, com algum trabalho e vontade, os
professores podem despertar estes alunos para a Matemática, proporcionando
momentos de aprendizagem ricos e significativos. (Filipe, 2017, p. 431)
4.3.3. Recursos nas escolas
Reforçando
esta necessidade de adaptação do programa de Matemática à especificidade de
cada curso, Rodrigues (2015) concluiu que se verificaram algumas dificuldades
da parte dos professores envolvidos no seu estudo em adaptarem a Matemática à parte técnica dos cursos, para o que poderá
ter contribuído a inexistência de recursos e de formação nesta área:
Todos
os professores afirmaram tentar adaptar a matemática ensinada à parte técnica
dos cursos, confessando que têm algumas dificuldades nas aplicações práticas da
matemática em alguns módulos. Neste âmbito torna-se evidente que não existe
formação nesta área, e são praticamente inexistentes os recursos aos quais os
professores possam recorrer para enriquecerem os seus conhecimentos sobre a
matemática adequada. (Rodrigues, 2015, p. 169)
Ainda,
com o objetivo de ultrapassar estas dificuldades, Rodrigues (2015) sugere a
criação de equipas para desenvolverem
materiais tendo em vista a sua adaptação à área técnica de cada curso:
(…) poderiam criar-se equipas
para desenvolverem sebentas de apoio ao ensino de cada módulo dos programas de
Matemática, com tarefas dirigidas a cada área de formação que integra o
catálogo nacional de qualificações, reestruturando a carga horária dos módulos,
de acordo com a sua importância relativa na área técnica de cada curso.
(Rodrigues, 2015, p. 172)
Noutro estudo,
também é evidenciada a necessidade do apetrechamento
das escolas com equipamentos adequados, sendo um aspeto essencial para a
credibilidade do Ensino Profissional a funcionar nas Escolas Secundárias:
O apetrechamento das Escolas
assume uma importância que foi subvalorizada em experiências profissionalizantes
passadas que envolveram Escolas Públicas e é essencial para a credibilização
desta oferta nas Escolas Secundárias. (Oliveira das Neves et al., 2010, p. 95)
4.3.4. Revisão do currículo
Algumas áreas da
Matemática assumem uma importância crescente no ensino em geral, mas especialmente
no Ensino Profissional, como é o caso claramente da Estatística. Não só será
necessário analisar quais os conhecimentos estatísticos necessários aos futuros
profissionais, provavelmente alargando os módulos de Estatística atualmente
oferecidos, como será preciso formar os professores para se prepararem com
qualidade, em termos científicos e em termos didáticos, para os desafios
educacionais necessários:
A formação nesta área da Estatística poderá ter um papel
preponderante no ensino das distribuições bidimensionais, alertando para
aspetos a serem trabalhados e identificados como problemáticos nesta
experiência de ensino, e ou ainda, existirem mais equipas colaborativas que
permitam uma maior partilha de conhecimentos e reflexão sobre as práticas.
(Filipe, 2017, p. 430)
A investigação
de Filipe (2017) prova que os desafios da Estatística são ultrapassáveis nos Cursos
Profissionais.
Em síntese, num
trabalho apresentado no Congresso Internacional de Educação Matemática de 2012,
Carvalho e Silva (2012) propõe que se inicie o estudo da situação atual do
Ensino da Matemática dos Cursos Profissionais com vista à revisão do currículo
de Matemática que a análise aconselhar:
(...) estamos no momento certo para uma análise profunda
da situação dos estudos vocacionais em Portugal de modo a fazer propostas
concretas da revisão dos programas e também determinar os passos necessários a
tomar nas escolas e no Ministério da Educação de modo a melhorar a situação.
(Carvalho e Silva, 2012, p. 1842)
Referências
Carvalho
e Silva, J. (2012). The mathematics teaching in Vocational schools in Portugal. ICMI. ICME-12 Preproceedings. (1.
ed., v. 1, pp. 1838-1843). Seoul: ICMI.
Filipe,
N. (2017). Conhecimento para ensinar estatística em contexto de modelação: um estudo com professoras de matemáticado ensino profissional. (Tese de doutoramento, Universidade de Lisboa).
DGFV —
Direção Geral de Formação Vocacional (2004). Programa. Componente de formação científica. Disciplina de Matemática.
Lisboa: Ministério da Educação.
Fernandes,
S., Pereira, P., Duarte, J., & Canto e Castro, L. (2019). Estudantes à saída do Secundário em 2017/2018 (Dados provisórios). DGEEC - Direção de Estatísticas da Educação
e Ciência.
Oliveira
das Neves, A., Pereira, C., Santos, F., Godinho, R., &
Pereira, T. (2010) Avaliação externa do impacto da expansão dos Cursos Profissionais no Sistema Nacional deQualificações. IESE. ANQ.
Rodrigues,
A. (2015). A matemática no ensino profissional.Os programas e as representações dos professores. (Tese de Doutoramento, Universidade
da Beira Interior)
Rodrigues,
A. (2018). Ensino profissional: educar para o futuro. Atas do XXIX Seminário de Investigação em Educação Matemática. APM:
Lisboa.
POCH 2020 (2019). OCDE
destaca o papel do Ensino Profissional no combate ao abandono escolar. Obtido
de
Legislação
Decreto-Lei n.º 74/2004, de 26 de março, Diário
da República n.º 73/2004, Série I-A de 2004-03-26.
Portaria n.º 1031/2009 de 10 de setembro, Diário
da República n.º 176/2009, Série I de 2009-09-10.
Decreto-Lei n.º 55/2018 de 6 de julho, Diário da
República n.º 129/2018, Série I de 2018-07-06.
Portaria n.º 235-A/2018 de 23 de agosto, Diário da República n.º 162/2018,
1º Suplemento, Série I de 2018-08-23.
[1] “Para a certificação da conclusão
de um curso do ensino recorrente, bem
como de um curso profissional de nível secundário, não é obrigatória a aprovação
nos exames nacionais, exceto nos casos em que o aluno pretenda prosseguir
estudos de nível superior” (Decreto-Lei n.º 74/2004, art.º 15.º n.º 3).
[2] Em
cumprimento do artigo 26.º da Portaria n.º 550-C/2004, o programa da disciplina
de Matemática dos Cursos Profissionais chegou a estabelecer que as provas de
exame incidiriam apenas sobre alguns dos módulos do programa (DGFV, 2004, p. 8).
[3] 2014 - 31%,
2015 – 11%, 2016 - 32%, 2017 – 26%, 2018 – 23% (comunicação pessoal).
[4] A equipa de
autores é constituída por Arsélio de Almeida Martins, Cristina Maria Cruchinho
da Fonseca, Ilda Maria Ferreira do Couto Lopes, Luísa da Conceição Santos Canto
e Castro de Loura, Maria Eugénia Santos Lino Pires Graça Martins, Maria
Graziela Esteves Carvalho Fonseca e Jaime Maria Monteiro Carvalho e Silva (que
coordenou).
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